domingo, 18 de agosto de 2013

Juscelino sabia que queriam matá-lo, diz ex-secretário


Em 1976, ano de sua morte, Juscelino Kubitschek sabia das chances de se reeleger e dar curso à trajetória que daria fim ao regime militar no Brasil. A vantagem, no entanto, era motivo de preocupação dos agentes da Operação Condor, aliança político-militar entre as ditaduras do Brasil, Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai. 

Por Marsílea Gombata*, na CartaCapital


Como comprova a carta enviada no dia 28 de agosto de 1975 pelo chefe do serviço de inteligência de Augusto Pinochet, o coronel Manuel Contreras Sepulveda, para João Baptista Figueiredo. No documento, ele se dizia preocupado com a possível vitória do democrata Jimmy Carter nos Estados Unidos e o apoio a políticos de oposição ao regime militar na região, como o chileno Orlando Letelier e o próprio JK, que poderiam “influenciar seriamente a estabilidade do Cone Sul”. No ano seguinte, JK morria em agosto e Letelier, em setembro. O acidente com um Opala na Via Dutra selou a versão oficial para a morte do ex-presidente, que tentava articular a volta da democracia ao País.

Envolta em polêmicas, sua morte é um dos principais pontos a serem desvendados pela Comissão da Verdade Vladimir Herzog, da cidade de São Paulo. O órgão, que busca ajuda da Comissão Nacional da Verdade para investigar as circunstâncias que envolveram a morte de JK, realizou nesta terça-feira 13 uma audiência para buscar esclarecer o acidente que o teria matado.

Serafim Melo Jardim, secretário particular de JK em seus últimos nove anos de vida e ex-chefe de gabinete durante seu governo em Minas Gerais, disse à comissão ter certeza que o ex-presidente vinha sendo vigiado. “Eu acompanhei o presidente desde que voltou do exílio. Sempre que viajávamos ele dizia: ‘Estão querendo me matar’.”

Para ele, a hipótese de que a morte não acidental é clara. Além da carta de Contreras, há um fato atropelado pela versão oficial: a falta de radiografia do corpo do motorista Geraldo Ribeiro, apesar do fragmento metálico de sete milímetros em seu crânio, que seria uma grave indicio de arma de fogo. As fotos dos corpos, lembrou o advogado e autor do livro A Morte de JK Paulo Castelo Branco, foram retiradas do processo a mando de Francisco Gil Castello Branco, ex-diretor do Departamento Técnico-Científico da Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro à época. “A ordem era que tirassem as fotos do processo para preservar a imagem do presidente. Juridicamente isso não existe”, disse. “O Gil Castello Branco fazia parte desse sistema da ditadura e determinou ainda a troca da perícia que investigou o carro.”

Depôs ainda na sessão desta terça-feira [13] o advogado Paulo Oliver, uma das testemunhas-chave para o esclarecimento da morte, que no momento do acidente estava em um ônibus da Viação Cometa que teria batido no carro do ex-presidente. Ele lembra ter ouvido um barulho e visto um clarão que cruzou a pista e bateu em um caminhão e não no ônibus de viagem, como assegura a versão oficial. “Tenho certeza absoluta que não houve batida”, lembrou.

Para Gabriel Junqueira Villa-Forte, filho de Milton Junqueira Villa-Forte, um dos criadores do serviço secreto da Aeronáutica, a morte do ex-presidente foi acidental. Apesar da suspeita de que o veículo de JK tenha sido sabotado durante a parada em Resende, no Hotel Fazenda Villa-Forte de seu pai, o filho do brigadeiro não crê em assassinato. “Antes de ser chamada de curva do Juscelino, esse trecho tinha o nome de curva da brisa”, disse. “Ali bate muito vento, o piso é irregular, a curva é descompensada. Se for muito rápido, perde-se o controle. O motorista, simplesmente, foi um pouco mais rápido naquela curva, que é tão fatal como a curva do Calombo, na Lagoa Rodrigo de Freitas.”

Natalini, no entanto, enxerga evidências importantes que impedem a sustentação da versão oficial. “Esse é um ponto complexo, que implica diretamente no desdobramento político do País. O caso não está encerrado.”

A investigação sobre a morte do ex-presidente, segundo Jardim, representa uma “farsa” e deve-se buscar a verdade além da versão oficial. “Em 272 dias morreram Juscelino, Jango e Lacerda. Todos os três participariam da abertura democrática deste País.”

*Marsílea Gombata é jornalista e repórter do site de CartaCapital.

Nenhum comentário: