O pronunciamento em que a presidenta Dilma Rousseff anunciou
oficialmente a redução das tarifas de energia elétrica, em rede nacional
de rádio e televisão, no dia 23 de janeiro, provocou reação irada da
oposição política, isto é, de partidos e da grande mídia.
Por Venício A. de Lima, em Teoria e Debate
Depois de meses vendo, ouvindo e lendo a monótona repetição diária do discurso adversário único da grande mídia, a população brasileira teve a oportunidade de ouvir da própria presidenta a posição oficial do governo. Algum contraditório foi finalmente apresentado, mesmo que para isso o governo tenha sido obrigado a recorrer às prerrogativas legais que lhe facultam a convocação de uma rede nacional de radiodifusão.
Além do fato em si – a redução das tarifas –, os trechos do pronunciamento que mais irritaram a oposição foram aqueles em que a presidenta identifica como precipitadas, desinformadas, sempre do contra e alarmistas as pessoas que desacreditaram não só da redução das tarifas de energia elétrica, mas também de outras políticas públicas implantadas no país, em contraposição ao time vencedor, que tem sido aquele dos que têm fé e apostam no Brasil. Disse ela:
Surpreende que, desde o mês passado,
algumas pessoas, por precipitação, desinformação ou algum outro motivo,
tenham feito previsões sem fundamento, quando os níveis dos
reservatórios baixaram e as térmicas foram normalmente acionadas. Como
era de se esperar, essas previsões fracassaram. (...) Cometeram o mesmo
erro de previsão os que diziam, primeiro, que o governo não conseguiria
baixar a conta de luz. Depois, passaram a dizer que a redução iria
tardar. Por último, que ela seria menor do que o índice que havíamos
anunciado. (...) Neste novo Brasil, aqueles que são sempre do contra
estão ficando para trás, pois nosso país avança sem retrocessos, em meio
a um mundo cheio de dificuldades. Hoje, podemos ver como erraram feio,
no passado, os que não acreditavam que era possível crescer e distribuir
renda. Os que pensavam ser impossível que dezenas de milhões de pessoas
saíssem da miséria. Os que não acreditavam que o Brasil virasse um país
de classe média. Estamos vendo como erraram os que diziam, meses atrás,
que não iríamos conseguir baixar os juros nem o custo da energia e
tentavam amedrontar nosso povo, entre outras coisas, com a queda do
emprego e a perda do poder de compra do salário. (...) O Brasil está
cada vez maior e imune a ser atingido por previsões alarmistas. Nos
últimos anos, o time vencedor tem sido o dos que têm fé e apostam no
Brasil. [Pronunciamento da presidenta da República sobre a redução da
tarifa de energia elétrica].
Falar versus fazerO episódio confirma uma das principais características da grande mídia brasileira: a distância abismal entre o que alardeia como bandeira sua e seu comportamento real.
É flagrante a ausência do “outro lado” na cobertura política que a grande mídia oferece, como já mencionado. Por exemplo: após o pronunciamento da presidenta, é extremamente significativo o quase silêncio em relação às “quedas de energia” que provocaram enormes paralisações em eventos da grandeza do Superbowl, nos Estados Unidos (New Orleans, em 3 de fevereiro), e na partida de abertura do torneio internacional de basquete da Liga das Américas, na Venezuela (Barquisimeto, em 8 de fevereiro). A omissão interessada substitui regras básicas de qualquer manual de redação.
Não se trata, evidentemente, apenas da questão da energia elétrica. Prevalecem pesos e medidas diferentes, dependendo do lado “político” envolvido.
A esse comportamento assimétrico soma-se a acusação de que o governo politizou a questão da energia elétrica. Trata-se de um descarado cinismo não reconhecer que o tema estava desde sempre politizado, e para apresentar (finalmente) sua posição o governo teria, necessariamente, de identificar a posição contrária – como bem o fez.
Aparentemente, a “carapuça” de precipitados, desinformados, sempre do contra e alarmistas encontrou seus destinatários e foi por eles assumida.
Basta cumprir a Constituição
No final das contas, a reação irada da oposição – partidos e grande mídia – ao pronunciamento da presidenta põe uma vez mais em evidência as enormes distorções que existem na cobertura política oferecida ao país.
A melhor forma de tratar esse problema é, simplesmente, cumprir o que há mais de 24 anos está escrito na Constituição.
A regulamentação do “princípio da complementaridade” (artigo 223) possibilitaria o fortalecimento dos sistemas estatal e público, alternativas ao sistema privado, hoje hegemônico. Além disso, impediria o oligopólio midiático, direto e/ou indireto, de alguns poucos grupos empresariais (vetado pelo § 5º do artigo 220) e o controle que ainda exercem sobre a agenda pública e a liberdade de expressão no Brasil.
*Venício A. de Lima é jornalista e sociólogo, pesquisador visitante no Departamento de Ciência Política da UFMG (2012-2013), professor de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor de Política de Comunicações: um Balanço dos Governos Lula (2003-2010), Editora Publisher Brasil, 2012, entre outros livros
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