quarta-feira, 9 de maio de 2012

Descaso com a cultura: Orquestrando a Vida faz mais um ato para evitar a morte


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Caía a tarde quando músicos trajando luto chegaram à praça São Salvador, no Centro de Campos. Ao som de violinos, violoncelos, flautas, oboés e tantos mais instrumentos, cerca de 150 crianças e adolescentes da ONG Orquestrando a Vida, do Centro Cultura Musical de Campos (CCMC), fizeram seu pedido em forma de melodia. Nos últimos dias, foram realizadas manifestações pela cidade, simulando o velório dos projetos mantidos pela ONG, como a Orquestra Sinfônica Mariuccia Iacovino. Nesta quarta-feira, os jovens músicos se organizaram em cinco orquestras e uma banda sinfônica para seu último ensaio oficial, sob risco de encerramento definitivo de suas atividades devido à falta de patrocínio. Apresentaram-se a Banda Sinfônica Hermes Cunha, a Orquestra Sinfônica Mariuccia Iacovino e as Orquestras Infantil, Infanto-juvenil, Escola, Juvenil e Jovem.
 
O presidente, fundador da ONG e também maestro da Orquestra Mariuccia Iacovino, Jony William Vilela, passou mal após o velório simbólico da última terça-feira e precisou ser hospitalizado, mas, ainda assim, conseguiu assistir ao ensaio desta quarta.
 
— A partir de amanhã, não teremos mais ensaios. Só retornaremos a nossas atividades quando tivermos certeza de que temos condições para isso — disse o maestro.
 
Durante a noite desta quarta, o secretário de cultura Orávio de Campos se manifestou relatando que a Prefeitura sempre apoiou a ONG. “Em 2009 a Prefeitura de Campos celebrou convênio com a ONG, com repasses de recursos da primeira parcela, que não pôde ser renovado pela ausência de prestação de contas no prazo legal previsto. Em 2010 foi dada a oportunidade para novo convênio com o Trianon, não sendo apresentadas as documentações legais necessárias para elaboração do convênio”, afirmou Orávio.
 
O instrumentista Charles Vilela, filho de Jony William, ressaltou que a iniciativa não tem como intenção mostrar hostilidade, mas sim sensibilizar o público e reunir todo o tipo de ajuda possível.
 
— Não queremos atrito com o poder público, estadual ou municipal, e nem instituições privadas. Mas queremos alertar a população sobre nossa situação. Temos o aval do mundo inteiro, que confirma nossa capacidade. Esse projeto é essencial para a instrução desses jovens: muitos maestros e mestres em música que tocam em orquestras de todo o país se formaram conosco. Nós ajudamos a transformar a realidade sociocultural de Campos — disse.
 
O secretário de Cultura também ressaltou que a prefeitura continua com a intenção de apoiar a Orquestrando a Vida. “A Prefeitura de Campos mantém sua posição de apoio à ONG “Orquestrando a Vida”, contratando, até o momento, no ano de 2012, mais sete apresentações de suas orquestras, em um valor de R$ 59.500, e continua aberta ao diálogo para discussão de novas propostas de parcerias”, relatou.
 
A sociedade compareceu ao evento da noite de ontem e mostrou interesse pelo trabalho musical e educacional dos projetos do Centro Cultura Musical. A professora do curso de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense (UFF), Antenora da Mata Siqueira, esteve no local da manifestação na companhia de alunos para prestar apoio à ONG e suas orquestras.
 
— Viemos aqui apoiar e prestar solidariedade ao movimento, pois entendemos a importância desse projeto sociocultural que trouxe tantas oportunidades não só para os jovens integrados à ONG como também suas famílias e que valoriza tanto a cultura de nosso município e do mundo. Acho válido que todos contribuam como puderem, pois se o poder público não se pronuncia e a auxílio vindo de empresas privadas também não apareceu, cabe à população se mobilizar para que algo seja feito. É por isso que esta ação é importante — conta a professora, acrescentando que “Cada um a sua maneira poderia organizar formas de captar quaisquer recursos à disposição. Isso tem tudo a ver com a instrução de nossos jovens, e não merece acabar dessa maneira”, completa a professora.
 
Na última teça-feira, o líder da bancada governista, Jorge Magal garantiu a assinatura de um convênio entre a prefeitura e a ONG nos próximos dias. “Garanto a vocês que o novo convênio da prefeitura com a ONG Orquestrando a Vida, será assinado nos próximos dias. O anterior caducou. A prefeita nos pediu solução. Todos nós reconhecemos a importância desta escola de música que atende a mais de 700 crianças. Já foi realizada uma reunião no gabinete da prefeita e formada uma comissão de trabalho, com a participação do vice-prefeito, Dr. Chicão, do procurador geral, Francisco de Assis Filho, e do secretário municipal de Controle, Suledil Bernardino. Estamos fazendo a nossa parte. Sempre apoiamos e vamos continuar apoiando a ONG Orquestrando a Vida. A oposição também poderia ajudar conseguindo apoio dos governos federal e estadual. A verdade é que falam muito, mas não se mexem”, frisou  Magal, garantido, com todas as letras, que  a Orquestra Sinfônica Mariuccia não vai parar de tocar. Essa é a esperança das 750 crianças atendidas pela ONG, assim como de suas famílias. A estudante e flautista da Orquestra Mariuccia Iacovino Natalie Lessa acredita ainda no futuro, mesmo que incerto, do projeto. “Eu sinto muita tristeza pelos rumos que estamos tomando. Fui criada aqui dentro e estou há seis anos envolvida com as orquestras. Posso garantir que elas mudaram a vida de muita gente”, desabafa. Após tocarem a última música na noite desta quarta, os jovens músicos se abraçaram e sorriram com a certeza de que a “esperança é equilibrista” e a sabedoria de que “o show de todo artista tem que continuar”.

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