terça-feira, 20 de setembro de 2011

Os comunistas no Brasil e a crise


Por Osvaldo Bertolino
Durante o “IV Colóquio Internacional Marx e os Marxismos” realizado entre os dias 12 e 16 de setembro na Universidade de São Paulo (USP), o “Portal Grabois” acompanhou o debate “Reflexões sobre a história do comunismo no Brasil”, com Antonio Carlos Mazzeo (UNESP), Francisco de Oliveira (USP), João Quartim de Moraes (Unicamp) e Plínio de Arruda Sampaio (PSOL), e a conferência de encerramento “A financeirização do capital e a atual crise econômica” com o professor François Chesnais, da Universidade de Paris XIII.

Nas “Reflexões sobre a história do comunismo no Brasil” os debatedores comentaram o lançamento do livro Memórias, de Gregório Bezerra, pela Boitempo Editorial, citaram passagens da trajetória do lendário revolucionário e teceram considerações sobre a história das diferentes vertentes que se definem como comunistas no Brasil. Com visões diferenciadas sobre diferentes aspectos dessa história, o debate confluiu para a constatação de que a história do Brasil no século XX não pode ser contada sem a participação decisiva dos comunistas. João Quartim de Moraes, por exemplo, disse que o comunismo no Brasil chegou antes do marxismo.

Segundo ele, antes de chegar às universidades o marxismo foi estudado por abnegados, sob condições de feroz peseguições, na mais rigorosa clandestinidade. Lembrou que o comunismo no Brasil surgiu como reflexo da Revolução de Outubro na Rússia e citou os estudos de Astrojildo Pereira e Octávio Brandão como exemplos de busca concreta de compreensão da situação do país quando surgiu o Partido Comunista do Brasil (PCB), em 1922. Para ele, o livro de Brandão Agrarismo e industrialismo, com todos os “devaneios dialéticos”, é um importante marco da história do comunisno no país.

João Quartim de Moraes lebrou que Brandão estava “apaixonado pela dialética”, tomado pela alegria da descoberta do conhecimento, quando escreveu o livro. Mas a obra foi importante para a compreensão da idéia da aliança operário-camponesa. O autor concluiu que os comunistas deveriam se esforçar para atrair a “burguesia nacional” (nacionalista) que se articularia com os trabalhadores e camponeses contra os obstáculos ao “desenvolvimento nacional”. Para o professor, desde então os comunistas se pautaram por reformas sempre com poisção de classe, dando sentido concreto às lutas do povo.

Sobre Gregório Bezerra, João Quartim de Moraes citou a riqueza de humor na narrativa de suas memórias. Francisco de Oliveira também se referiu a esse aspecto, lembrando que a história do líder comunista remetia à passagem citada por Karl Marx e Friedrich Engels no Manifesto do Partido Comunista em que disseram que o espectro do comunismo rondava a Europa. “Gregório Bezerra era um epectro que rondava o Nordeste. A burguesia tinha mais medo dele do que se pode imaginar”, afirmou. Segundo Francisco de Oliveira, o comunista pernambucano impôs a primeira derrota ao regime golpista de 1964.

Ele lembrou que Gregório Bezzera foi capturado no interior do Estado de Pernambuco e, no Recife, o celerado tenente-coronel Darcy Viana Vilock o conduziu com uma corda no pescoço pelo bairro burguês de Casa Forte. Durante o trajeto, as pessoas fecharam portas e janelas para não ver o espetáculo macabro. Provocado pelo seu algoz, respondeu com altivez que era um comunista, um patriota e democrata. Para Francisco de Oliveira, o livro de memórias de Gregório Bezerra deve ser lido com prazer, observando seu tom irônico e sarcástico, um rico relato da história doBrasil escrito de forma não acadêmica.

Francisco de Oliveira fez críticas ao Partido Comunista, que segundo ele falhou na tarefa a que se proppõs, mas ressalvou que não se pode contar a história do Brasil sem mencionar o papel dos comunistas na construção da cultura brasileira. Na interpretação do Brasil, o partido falhou, mas, em sua opinião, isso se deve ao fato de que a União Soviética oprimiu a capacidade dos partidos comunistas de interpretar as realidades de cada país.

Segundo Francisco de Oliveira, no Brasil o partido comunista tinha tudo para desvelar aquilo que só apareceu com força quando a Cepal interpretou a América Latina. Para o professor, Celso Furtado, um importante pensador, fez muitas interpreções que ele considerou marxistas — embora não tenha se revelado como adepto dessa concepção. Antonio Carlos Mazzeo e Plínio de Arruda Sampaio fizeram considerações de ordem política, destacando igualmente aspectos generalizados da trajetória comunista no Brasil.

François Chesnais

Na sexta-feira (16), o professor François Chesnais fez considerações sobre a crise financeira global, tema da coletânea A finança mundializada que reúne textos por ele organizados. Trata-se de uma colaboração importante para o entendimento das alterações ocorridas ao longo das três últimas décadas na estrutura e gestão de riqueza capitalista e na operação dos mercados financeiros.

No livro, François Chesnais e mais onze autores de diversas áreas da economia dissecam as relações entre mercado financeiro e a hegemonia norte-americana. Além disso, analisam os riscos presentes na combinação de uma grande dependência externa da superpotência com uma doutrina de segurança agressiva de guerras “preventivas”.

Na palestra, Chesnais comentou que não via no Brasil a mesma intensidade da crise que ele observara na Europa. Segundo ele, os desastres econômicos que se espalham pelo mundo certamente resultarão em mudanças sócio-políticas. Falando em espanhol, o professor se alongou na explicação sobre o papel do “capital fictício” e ressaltou que pelos estudos de Marx é possível concluir que cada crise tem suas particularidades. Segundo Chesnais, essa constatação é importante para não se analisar a crise atual com parâmetros de crises do passado, de forma mecânica.


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